O homem é finito, contudo, dificilmente reflete sobre a sua situação no mundo como um ser que carrega no seu âmago uma carência ontológica, e o desejo que ele tem de complementar tal falta com a angústia de uma busca incessante de preenchimento do nada que o habita.
O fato de ele ser finito, quase nunca se torna um problema filosófico, visto que a maioria só se dar conta disso quando enfrenta uma crise, uma ruptura radical na monotonia do cotidiano, um fato inesperado que lhe tira o chão até então sólido. A areia movediça e o abismo passam a ser algumas das suas escolhas...Todavia, mesmo diante do mais profundo desespero, quase sempre o homem recorre aos mais diversos paliativos para não ter que enfrentar a realidade de frente: bebidas alcoólicas, drogas, religião, amigos, astrologia, psicólogos e até mesmo supostos videntes do além-túmulo e do "futuro".
Refugiar-se em ilusões e em dogmas sobrenaturais que lhe prometem a infinitude e a eternidade é um "placebo" importante.
Entretanto, encarar a finitude, a consciência dos nossos limites e a certeza de que estamos atolados num tempo e espaço que não escolhemos e que a vala é o nosso destino, é o grande desafio e a noite negra em que todo ser humano deveria mergulhar. A consciência da finitude faria o homem repensar valores, práticas, regras e normas que não fazem o menor sentido...
Se fôssemos eternos, talvez eu seria o homem mais ambicioso do mundo, mas que diferença fará daqui a alguns anos se fui famoso ou anônimo, rico ou pobre, bonito ou feio? Nenhuma. Escolher, porém, uma ética que fará de mim uma pessoa mais digna, mesmo durante o curto período que estarei neste mundo, é, com certeza, uma escolha mais interessante. Não sabemos de outras realidades e dimensões espirituais, mas ninguém duvida de que alguém morre, é colocado no féretro, e nos demais rituais humanos a respeito desta grande conhecida: a morte e um corpo cremado, enterrado ou jogado em qualquer lugar.
Infelizmente, a imensa maioria dos seres humanos passa pela vida sem fazer uma pergunta sequer sobre a carência humana. Mascaramos as nossas angústias com diletantismos de gosto duvidoso.
Todavia, o difícil é perceber o buraco existencial e as dores deste mundo com dignidade. Neste sentido, um mergulho nas trevas da nossa "alma" pode ser um grande diferencial. Compreender que, apesar da carência, da falta, do vazio, o homem pode distinguir o que é essencial para ele e o que é aparência. A primeira é escolher a liberdade e a autonomia, a segunda é fingir escolher e, assim, alienar a própria consciência, quase sempre com gente estúpida e que vive como um pé-de -quiabo...
Texto: MARCO AURÉLIO MACHADO