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quarta-feira, 30 de setembro de 2015

SOMOS TODOS SOFISTAS?

Desde a aurora da Filosofia, cujo nascimento convencionou-se,  entre a maioria dos historiadores e estudiosos,  considerar o século VI a.C, e que a tradição histórica considerou como pai, o filósofo grego, Tales de Mileto; aquele pré-socrático, que disse pela primeira vez, que a água era a arché de todas as coisas: era o advento da Filosofia. A razão é a filha nobre que "separa" a explicação cosmogônica da cosmologia. A primeira tinha que ver com os mitos, com os deuses, numa palavra, com o sobrenatural. A segunda, recorria apenas ao Lógos, à razão, ao homem, e a explicação agora concentrava-se na capacidade humana de explicar os fenômenos da natureza sem recorrer ao sagrado. O homem estava começando a engatinhar na autonomia e na liberdade...

Evidentemente, que no decorrer do tempo apareceram outros filósofos e o elemento divino sempre esteve presente,  de uma ou outra forma. Talvez, não seja por acaso, que o filósofo francês e ateu militante, Michel Onfray, esteja escrevendo uma Contra-História da Filosofia, ou seja, ele está tentando resgatar os filósofos materialistas e hedonistas que, segundo ele, foram vencidos pela longa História da Filosofia, cuja matriz é, em última análise, platônica. Ele até cita outros, mas Platão é o alvo principal do idealismo e da inversão do mundo. 

Tivemos, depois da preocupação filosófica com o elemento primordial, material, de todas as coisas, ou seja, a cosmologia, a physis, um deslocamento para a antropologia, a vida social, política e ética na pólis - cidades-Estado grega. É em tal contexto que temos a consolidação da democracia e o aparecimento dos sofistas e de Sócrates. Aqueles, segundo as más línguas, queriam vencer o debate, a discussão nas ágoras (praças públicas) a qualquer custo. Os principais nomes, destes verdadeiros mestres do discurso, da oratória e da retórica, são Protágoras de Abdera e Górgias de Leontini.   Eram eloquentes e capazes de opor argumentos e persuadir as pessoas com certa facilidade, além de cobrarem caro por ensinar tal arte nas diversas cidades que perambulavam. A verdade, para eles, era relativa e circunstancial. Em outras palavras, a verdade se confundia com a capacidade de persuasão. O importante era vencer o debate. Eram professores dessa arte e,  numa democracia direta, mais uma vez,  quem podia pagar,  aprendia as técnicas e influenciava as decisões nos debates. 

Sócrates, pelo contrário, criticava as cobranças dos sofistas e pensava que o saber não se vende. (Talvez seja por isso que os professores ganham tão mal...) O filósofo, Sócrates, vivia fazendo perguntas a todos, e argumentava que perguntava porque não sabia. Utilizava o método da Ironia e da Maiêutica. A primeira, tinha como fim a desconstrução das meras opiniões que os atenienses pensavam que sabiam. A segunda, Maiêutica,  etimologicamente, é a arte de trazer à luz, partejar. Só que no caso de Sócrates, trazer à luz novas ideias. Enfim, desconstruir e reconstruir novas ideias. A mãe de Sócrates,  Fenareta,  era parteira.  Não é difícil deduzir o que Sócrates fizera, não é mesmo? 

Sócrates buscava,  não a relatividade dos sofistas, mas o conceito, o universal e necessário. Ele queria a essência, ou seja, o que subjaz a aparência. Esta muda, aquela permanece. Não foi à toa que Platão, discípulo de Sócrates, inventou um outro mundo e aprofundou a metafísica de Parmênides,  e foi além da metafísica embrionária socrática...

Poderia citar um pouco mais de Platão e do seu principal discípulo, Aristóteles, um dos maiores filosófos e metafísicos de todos os tempos, mas o meu interesse é voltar ao tema da pergunta: "Somos todos sofistas"?

Quem dera se tivéssemos a competência para chegar ao menos perto dos grandes sofistas da Grécia antiga, todavia, vivemos numa época de riqueza da linguagem por algumas elites e de uma pobreza absoluta da linguagem pelas massas do mundo inteiro. E o que é pior: muitos linguístas, com o pretexto de "respeitar" as diferenças e a multiplicidade dos "cidadãos", a diversidade das culturas, preconizam e até estimulam uma linguagem paupérrima de significados. Esta, sem dúvida, torna a concepção de mundo dos mais explorados muito mais complexa, pois dificulta a percepção mais ampla e rica da cultura humana, patrimônio que deveria ser de todos. O que tais "especialistas" não percebem é que também estão alienados e reproduzem uma ideologia que deveriam combater. Principalmente, porque quem acredita nessas teses, dificilmente faz parte ou está inserido no contexto da realidade social, política, econômica e cultural dessas comunidades. 

A linguagem é o que nos faz diferentes dos animais, e como seres humanos, temos o direito de compreender, analisar, interpretar, refletir e dar um novo sentido ao discurso das pessoas que "falam e escrevem" bonito, afinal, numa democracia, de fato, e não apenas de direito, é preciso que a gama de sinônimos seja rica. A linguagem é poder e o poder domina, sobretudo, pelo apelo à força das palavras. Se fôssemos todos sofistas, a maioria dos políticos, advogados, médicos, jornalistas, mestres de propagandas e publicidades, vendedores, entre outros, não teria vida fácil conosco. 

Não é, por acaso, que a sociedade  desdenha a Filosofia...Esta, além de desmascarar e desvelar as ideologias e ilusões vendidas pelo atual sistema de produção, conhece noções de Lógica e as principais falácias e sofismas. Afora a capacidade de fazer perguntas, que são verdadeiras bombas atômicas,  para explodir o discurso fácil dos inimigos da verdade. 

Cuidado com a manipulação, pois ela está em toda parte...Até mesmo por muitos que querem nos vender um lugar no CÉU...

TEXTO: MARCO AURÉLIO MACHADO